segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Homenagem aos autarcas 2004 - colóquio realizado em junho de 2004

No momento em que cesso funções de presidente da direcção da Associação Barranquenha para o Desenvolvimento (ABpD), aqui ficam, pela sua actualidade, alguns extractos da intervenção proferida na abertura do Colóquio promovido por essa associação em Junho de 2004, no qual foram homenageados os autarcas locais, em especial os antigos titulares do cargo de presidente da câmara municipal de Barrancos.
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A Associação Barranquenha para o Desenvolvimento, é uma associação sem fins lucrativos, criada em Dezembro de 2003, que tem como objecto a promoção do desenvolvimento local e regional integrado, através de iniciativas nos domínios social, cultural, ambiental, cívico, recursos humanos, valorização do património natural e construído e o apoio às actividades produtivas.
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       O presente colóquio, integrado no plano de actividades da associação, subordinado ao tema Barrancos: Modelo de Desenvolvimento Local, tem como objectivo central reunir, pela primeira vez na história de Barrancos, as pessoas que, desde meados da década de 50 do século XX até hoje, exerceram o cargo de presidente da CMB.

       Para um colóquio com estas características foi escolhido o local que simbolicamente representa o centro do Poder de Barrancos e dos barranquenhos, o Salão Nobre dos Paços do Município de Barrancos. Outros locais houve, até porque este edifício, acompanhando a evolução do Poder Local e as transferências de competências que hoje detêm mudou várias vezes, mas contínua a ser o local privilegiado para debater Barrancos e as suas gentes.
Sem qualquer preciosismo histórico convêm aqui, resumidamente, situar a questão do Sistema de Governo Municipal desde o período Estado Novo.
       O Estado Novo, assente no sistema corporativo, veio reforçar a centralização do poder político. O presidente da CM era nomeado pelo governo e os vereadores eleitos pelo Conselho Municipal. Nenhum deles era remunerado pelas funções, que eram desempenhadas a título gracioso, quantas vezes com prejuízo da vida pessoal e profissional dos seus titulares,
       Os Municípios estavam financeiramente dependentes do Estado, pois as suas receitas mal chegavam para pagar as despesas obrigatórias, sendo os investimentos executados os inscritos no plano do Governo. Era o sistema das comparticipações.
       Foi neste contexto jurídico e histórico do municipalismo que surgiu a Revolução de 25de Abril de 1974.

       Nos termos da Constituição da República Portuguesa de Abril de 1976, a organização das autarquias locais, e neste caso dos Municípios, compreende uma assembleia eleita dotadas de poderes deliberativos e um órgão executivo colegial – a câmara municipal –perante ela responsável.
Foi também a partir de 1977, que o Governo reforça as finanças municipais, através das chamadas “verbas livres”, sendo posteriormente aprovada a primeira lei de finanças locais, nos termos da qual são reguladas as comparticipações devidas ou transferidas do Orçamento do Estado, permitido o acesso ao crédito, etc.
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       Neste encontro de autarcas, pretendemos que ao reflectir sobre o desenvolvimento de Barrancos, numa óptica descontraída e de apelo à memória, sejam contadas as experiências pessoais e profissionais dos intervenientes, as suas expectativas, dificuldades, constrangimentos, etc.
Para que isto fosse possível foram convidados os respectivos titulares, ainda vivos, dos quais apenas dois declinaram o convite, sendo aqui substituídos pelos respectivos vice-presidentes ou cargo similar.
       Aquando da aprovação do projecto do colóquio julgávamos que a sua concretização não teria certamente um caminho fácil, podíamos encontrar alguns obstáculos, deparar-nos com interesses, ambições pessoais ou aproveitamentos políticos.
       Felizmente, não foi assim, e como aqui se pode verificar, estão presentes desde o Sr. José Augusto Garcia Fialho, o mais antigo titular do cargo, ainda vivo – foi presidente da CMB de 1951-1965 - até ao actual titular Sr. Nelson Berjano - em funções desde Janeiro de 2002 – passando pelo titular do período da Revolução do 25 de Abril de 1974, que se manteve em funções, sem qualquer obstáculo ou pressão da população local, de 1972 a 9 de Julho 1974.
       Desse período revolucionário, conturbado e de incertezas, não posso deixar de referir um aspecto que para mim marca uma diferença e que denuncia o cansaço dos intervenientes políticos da época com um regime autoritário e fechado ao mundo: no dia 30 de Abril 1974, a CMB, em reunião extraordinária aprovou uma moção de congratulação, apresentada pelo seu presidente – Sr. José Augusto Lopes Fialho, aqui presente, na qual se lia “…ciente da vontade do Povo de Barrancos, perante factos consumados em 25 do corrente mês, propunha que fosse enviado à Junta de Salvação Nacional, um telegrama de incondicional apoio, adesão e colaboração da CMB no movimento de libertação levado a efeito pelas forças armadas”. Terminava a moção “fazendo votos para que a iniciativa tenha um êxito absoluto.”
       No texto da moção está patente a vontade dos membros da câmara municipal - órgão nomeado, à data, pelo Governo – e o sentimento de desencanto com um regime político que, apesar de pressionado pelos principais aliados da Europa e do Mundo, continuava a resistir à sua reforma e no fundo à sua continuidade.
       Em síntese, e glosando aqui um pouco a polémica deste ano relativa às Comemorações Nacionais dos 30 Anos do 25 de Abril de 1974, foi necessário uma Revolução para que se desse uma ruptura de regime e evolução no sistema político que uma grande maioria, à época, já ambicionava e estava à espera desde a Primavera Marcelista.
       Em Barrancos, e contrariamente ao que sucedeu um pouco por todo o País, a transição de regime no âmbito do Sistema de Governo do Município foi pacífica. Não houve invasões da “câmara”, não houve tumultos, não houve pressões. A mudança ocorreu apenas em 9 de Julho de 1974, com a posse da Comissão Administrativa (CA) nomeada pelo Governo Civil do Distrito de Beja, composta de três elementos: o Sr. José Domingos Gomes Escoval, que presidia, e pelos vogais, Srºs António Charrama Lopes, aqui presente, e Clemente Pires Marques.
       Foi esta CA que conduziu os destinos do Município até à posse dos primeiros eleitos locais, que ocorreu em inícios de Janeiro de 1977 e cuja CM passou a ser presidida pelo Sr. Carlos Caçador Durão, aqui presente, tendo como vereadores os Srs. António Semedo Guerra, Sebastião Santos Ramos, António Gomes Mira e António Charrama Lopes, único elemento que transitou da Comissão Administrativa.
       Para poder situar o estado de desenvolvimento deste município, permito-me resumidamente fazer uma breve caracterização de Barrancos, com base nos dados constantes do Diagnóstico Social de Barrancos, recentemente aprovado, apresentando na mesma algumas propostas estruturantes para o desenvolvimento de Barrancos:
       ● Até aos anos 60 do Séc. XX, o solo agrícola permitiu o sustento da população, mas o reflexo de várias condicionantes, quer económicas e até climatéricas contribuíram para essas mudanças e principalmente para o êxodo rural, uma vez que as alternativas existentes eram poucas.
       ● A partir da década de 60 do Séc. XX, o município registou fluxos migratórios significativos para outras regiões do País com maior capacidade empregadora e que necessitavam de mão-de-obra pouco especializada, devido à franca expansão e desenvolvimento da industria, sendo por isso muito apelativa a uma população que enfrentava condições de vida pouco satisfatórias. Foi também entre os anos de 1958-1964 que partiram os primeiros emigrantes com destino a França, depois Alemanha e Suiça. A busca de melhores condições de vida levou-os a abandonar Barrancos; lá ficaram, criaram os filhos e hoje muitos destes conterrâneos já reformados regressam.
       ● Hoje, a estrutura sócio-produtiva do município é marcada pela debilidade do tecido empresarial, dispondo de uma indústria fraca, ligada aos produtos endógenos: extracção de xistos duros, algum mel, azeite e a produção de enchidos e presuntos, estes últimos com potencial de desenvolvimento.
       ● Para atenuar as consequências da pouca ou quase inexistente oferta de trabalho e da consequente elevada taxa de desemprego, os agentes e entidades locais têm promovido algumas formas de «sustento» da população, através dos programas de actividade ocupacional e de cursos de formação profissional que permitem à população a obtenção de algum rendimento, fixando-os em Barrancos, evitando que a população abandone definitivamente esta terra.
       ● Este apego à terra, a Barrancos, é mais forte que a ansiedade que têm em relação ao futuro. Poucos são aqueles que se mostram disponíveis para trabalhar fora da sua terra, mesmo tendo consciência que as perspectivas de quem fica não são as mais desejadas.
       ● Importa, pois, reflectir sobre esta realidade. O desemprego, o isolamento social, a fraca dinâmica económica e os parcos recursos existentes no município poderão estar na origem de uma postura pouco activa por parte da população, para a resolução dos seus problemas sócio-profissionais. Resulta daqui a inexistência de projectos de vida dos jovens, sendo poucos os que têm definido objectivos e metas a atingir e que saibam como o fazer. Este é, talvez, um dos mais graves problemas do município, pois quando a população, principalmente os jovens, não têm expectativas e aspirações em relação ao futuro, não se podem esperar grandes mudanças na comunidade, quer sejam a nível económico quer social.
       ● Barrancos é pois um município onde existem alguns problemas relacionados, essencialmente, com a falta de projectos de desenvolvimento por parte da população, e para os quais as estruturas existentes não têm capacidade de resposta a curto e médio prazo. É nesta perspectiva que faz sentido intervir neste município. Intervenção que, só poderá ter resultados gratificantes para todos se se conseguir envolver a população, nomeadamente os jovens, ajudá-los na criação dos seus projectos de vida e consequentemente, na criação de uma nova dinâmica psicossocial e económica.
       ● Apesar de tudo não se detectam em Barrancos problemas sociais significativos. Existe nesta comunidade, pelas características rurais que conserva ainda hoje, redes de solidariedade que a defendem dos graves problemas sociais que assolam as sociedades urbanas.

       ● Para a fixação da população, a principal prioridade, deverá ser a aposta na fixação de empresas e criação de empregos, melhoria substancial no tecido social, nomeadamente no ensino, na saúde, na habitação, na velhice, etc.
       ● Na educação, para além da unificação do diferentes graus de ensino no mesmo edifício, a aposta será o alargamento da escolaridade até ao 12º ano, intenção prevista na nova Lei Bases de Educação em fase de aprovação no Parlamento.
       ● Uma outra prioridade detectada será a maior abertura da escola à população, que poderá passar por aquela promover, organizar e apoiar actividades culturais diversas, envolvendo a comunidade.
       ● Acreditamos que o estudo do “Barranquenho”, é um projecto que deve ser revitalizado e desenvolvido entre a CMB e a EBI, com o apoio e empenho de toda a comunidade, é uma possibilidade a ponderar pois levará à continuidade do falar barranquenho, dialecto que corre perigo de extinção.
       ● Na saúde, área muito sensível e necessitada, vemos com grande apreensão várias lacunas. A construção do novo Centro de Saúde, que deverá ser uma realidade em 2007 – a construir no largo do Mercado - não será condição sine quanom para satisfação desta problemática, sem que simultaneamente sejam colocados e preenchidos os quadros médicos desta unidade de saúde – três médicos de clínica geral e um de saúde pública. Basta acrescentar que hoje há apenas um médico em Barrancos. Aos fins-de-semana os cuidados de saúde são assegurados por um médico contratado pela CMB. Apesar de tudo, muita é a população que recorre ao Centro de Saúde de Encinasola, onde há médicos 24 horas por dia.
       ● Na habitação é urgente a disponibilidade de terrenos para construção, direccionados, preferencialmente, aos jovens casais, pois, também assim se poderá contribuir para a fixação da população. Uma outra intervenção importante tem a ver com a recuperação dos muitos imóveis degradados e em estado de abandono existentes na Vila, a qual poderá ser possível na sequência de alteração legislativa.
       ● Na velhice a prioridade será a construção de um Lar de terceira idade, em edifício adequado para as várias valências, pois o actual não tem condições mínimas para fazer face à procura que se verifica e que se comprova com o elevado número de pessoas em lista de espera.
       ● Aliada ao envelhecimento da população, à fraca densidade populacional e aos elevados índices de desemprego, o município vê-se confrontado com uma rede viária degradada e pouco atractiva para quem quer, ou precisa, de se deslocar. Quer a estrada nº 258 (St. Aleixo) construída há mais de 80 anos quer a estrada 386 (Amareleja), construída há cerca de 60 anos, mantêm o mesmo traçado inicial, com algumas intervenções mínimas de conservação. É urgente, pois, a construção de novos acessos ou pelo menos a sua renovação e correcção dos traçados.
       Com a resolução, em tempo oportuno, das prioridades enumeradas, a par de outras não tão urgentes mas necessárias, que se forem realizando, Barrancos tem futuro e poderá ser um espaço onde a qualidade de vida dos seus habitantes seja uma realidade e poderá contribuir para o auto estima deste povo.
       Estou convicto, até pela assistência aqui presente, que este colóquio (encontro) despertou a curiosidade da população local:
       - Curiosidade para conhecer os diversos titulares do cargo de presidente da CMB, desde meados da década de 50 do Séc. XX até esta data;
       - Curiosidade para conhecer as experiências pessoais e profissionais destes intervenientes, enquanto titular do cargo;
       - Curiosidade, em suma, por conhecer a história de Barrancos através das personalidades ou lideres locais.
       Queremos também que este colóquio seja o primeiro de muitos onde se reflicta sobre as questões de desenvolvimento local;
       Queremos também que este colóquio desperte a curiosidade da comunidade barranquenha para estas questões que são importante para o seu bem-estar e qualidade de vida, e contribua para o envolvimento de toda a comunidade.
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       Queremos também com este colóquio disponibilizar-nos para em conjunto com todas as entidades locais, incluindo a CMB e a JFB, buscar soluções e modelos alternativos de desenvolvimento que contribuam para a fixação da população e atenuem a desertificação humana de Barrancos.
       Por último e vendo que há vários autarcas entre os assistentes, alguns ainda em funções, permito-me daqui, em nome da ABpD prestar homenagem a todos os autarcas de Barrancos, sem esquecer aqueles que infelizmente nos deixaram, e reconhecer que, muitas vezes com prejuízo das suas vidas particular e familiar, serviram esta terra e as suas gentes.
Muito obrigado.
Ass) Jacinto Domingos Mendes Saramago
Presidente da Direcção
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Seguindo a cronologia dos períodos históricos, iniciaram-se as intervenções dos antigos presidentes e autarcas presentes, começando pelo Sr. José Augusto Garcia Fialho, o mais antigo presidente da CMB (falecido em 08/12/2006), terminando no titular do cargo naquela data, o Sr. Nelson Berjano.
Para o colóquio foram convidados todas as pessoas ainda vivas que, em diferentes épocas, exerceram o cargo de presidente da câmara municipal de Barrancos:
•José Augusto Garcia Fialho, presidente da CMB de 1955 até Agosto de 1965;
•Mário Francisco Fernandes Escoval, presidente CMB de 1965 (não compareceu por motivo de doença);
•José Augusto Lopes Fialho, presidente CMB de 1972 a 9 de Julho de 1974;
•José Domingos Gomes Escoval, presidente da Comissão Administrativa – de 09/07/1974 a 31/12/1976 (não compareceu tendo estado presente o Sr. António Charrama Lopes, vogal da mesma Comissão Administrativa);
•Carlos Caçador Durão, presidente CMB, Mandatos de 1977 a 1979 e de 1980 a 1982);
•Manuel Baleizão Chamorro, vereador-substituto do presidente da CMB - mandatos de 1983-1985 e de 1985 a 1989);
•Manuel Torrado Lavaredas, vereador-substituto do presidente – mandatos de 1990-1993,(não compareceu);
•António Pica Tereno, presidente CMB - Mandatos de 1994 a 1997 e de 1998 a 2001 (não compareceu);
•Nelson José Costa Berjano, presidente CMB - Mandato de 2002 a 2005).

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